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Bordado e Saúde Mental #1 - Dar conta da compulsão de agulha na mão!


A maioria das pessoas diz que não gosta de agulhas. Mas as agulhas, para mim, são como melhores amigas. Não falo das agulhas que nos picam mas sim das que seguramos entre dois dedos e perfuramos num tecido para que, lentamente, as linhas criem uma imagem. Falo das agulhas que usamos para bordar.


Numa altura em que o mundo tinha parado e nos vimos confinados entre quatro paredes por tanto tempo, muitos de nós sentimos algum impacto na nossa saúde mental. Algumas pessoas sentiram ansiedade pela primeira vez, outras talvez tenham tido oscilações de humor que nunca haviam experienciado antes. No meu caso, apesar de já habituada a lidar com depressão e ansiedade, descobri que tinha desenvolvido um comportamento compulsivo de arrancar pêlos / cabelos (tricotilomania) e fazer feridas na minha própria pele (transtorno de escoriação).


É estranho como um comportamento compulsivo pode ir aumentando de forma tão subtil, principalmente quando vivemos sozinhos e não há ninguém por perto para nos dizer “pára de fazer isso”. Nas férias do Verão de 2020, a minha família ajudou-me a notar que o meu corpo estava cheio de feridas e cicatrizes; e que eu era capaz de passar mais de uma hora de pinça na mão a arrancar pêlos um por um. Sim, parece impossível não é? Mas uma compulsão é isso mesmo: querer parar e não conseguir de maneira nenhuma.


Foi nesse mesmo Verão que decidi falar com o meu psicoterapeuta e psiquiatra sobre a minha dificuldade de parar estes comportamentos. Rapidamente percebi duas coisas: por um lado, que eu não era a única pessoa a passar por isto; e por outro, que teria de encontrar estratégias para lutar contra a compulsão. Depois de ler bastante sobre o assunto e ver alguns vídeos de pessoas com este tipo de transtornos, percebi que uma das estratégias mais eficazes era manter as mãos ocupadas. Se as minhas mãos estiverem ocupadas, a probabilidade de eu começar a fazer feridas ou arrancar pêlos é muito menor. E foi então que decidi voltar a bordar!


Talvez seja difícil de compreender isto, mas o meu comportamento tornou-se compulsivo porque eu experienciava uma espécie de alívio da minha ansiedade enquanto fazia o que fazia. Era um comportamento muito repetitivo, sempre com o mesmo tipo de movimentos e que fazia com que os meus pensamentos quase desligassem por eu estar completamente focada naquela atividade. Hoje em dia, é exactamente isso que sinto mas é enquanto estou a bordar - claramente uma atividade muito mais saudável!


Bordar permite-nos “desligar” um pouco a nossa mente. Os movimentos repetidos acabam por ir acontecendo sem que tenhamos que pensar demasiado e a sensação de ir vendo um trabalho a avançar ou ser completado também nos dá uma certa confiança e ânimo. Tocar nas texturas do tecido e das linhas, ouvir o som da agulha a perfurar o tecido e a linha a correr pelo buraco, sentir a tensão dos pontos, observar as cores… tudo isto contribui para o despertar dos nossos sentidos e a capacidade extra de estarmos no momento presente. E isso é extraordinário!


Se ainda tenho a compulsão? Certamente que tenho. Se ainda tenho recaídas? Oh, yes! A minha pele ainda tem marcas e as pessoas ainda me perguntam “o que é que tens aí?” ? Sim. Mas hoje em dia posso dizer com algum orgulho que a minha compulsão melhorou muito, que consigo controlá-la muito mais facilmente e que bordar é a estratégia mais bonita e que mais me preenche. Porque também a possibilidade de expressar as minhas emoções através do bordado é extremamente terapêutica! Mas sobre isso falaremos noutro artigo…


Se tens uma história, opinião ou ideia em relação ao bordado e saúde mental, conta-nos a tua experiência! Adoramos saber o que vocês pensam! :)


Até breve,


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